domingo, 10 de julho de 2011

Uma questão de Lixo

Caros leitores, após um período de interregno devido a obrigações académicas, regressam as minhas publicações mais ou menos económicas, conforme o ponto de vista.
Não pude deixar de falar na questão quente dos últimos dias: o downgrade (com perspectivas futuras negativas) da Moddy’s em relação à dívida pública portuguesa de Longo Prazo (acima de 1 ano), classificando-a na escala de Especulação (Ba1 – qualidade de crédito duvidosa).

Ora, no seio do Mundo Financeiro esta escala é vulgarmente apelidada de “lixo”, o que não deixa de ter o seu sentido, pois dívida pública que esteja exposta a um nível de risco tão elevado, por via do risco de falência (ou default), sem dúvida o mais importante, estará escalada em função desse factor. E sim, infelizmente é essa a nossa situação (apesar de não ser tão grave quanto a de outros exemplos), que leva consigo todos os sectores da economia, que também representam Portugal.

Não surpreende, portanto, aquilo que aconteceu. E, ao contrário de muitos, não me choca.
Eu próprio não era nascido e já Portugal vivia à base do dinheiro comunitário a fundo (quase) perdido. Desde que esse “biberão” terminou, com a entrada dos países do Leste europeu na União, eis que diversos problemas estruturais e conjunturais começaram a suscitar atenção e a assumir proporções inimagináveis, pois nunca tinham sido motivo de preocupação para os Governantes eleitos pelos cidadãos portugueses.
É certo que muitos argumentam a inexistência de alternativas políticas, na altura. Pois agora, menos alternativas existem: ou nos sujeitamos às imposições “acordadas” com a Troika, ou seremos um país a viver numa bancarrota irremediável.

Acrescendo a estes factos históricos, existe ainda a desconfiança dos investidores em relação à qualidade das políticas do FMI. O caso que maior polémica gerou (e ainda permanece) situa-se na América do Sul: Argentina, onde as políticas estruturais e conjunturais levaram ao desastre económico sem precedentes.

Mais: no meio financeiro, poucos são os que conhecem o actual Primeiro-Ministro, Dr. Pedro Passos Coelho. Todavia, começa a surgir reconhecimento das suas ideias reformistas, cujo impacto poderá ser bastante positivo para o presente e futuro da economia portuguesa.
No entanto, muitas dessas ideias esbarram no memorando e no "fantasma" da inadequação económica, financeira e social das políticas estruturais do FMI, cujo resultado está longe do esperado.
Aliando dois tipos de desconfiança (em Portugal e no FMI), é perfeitamente natural que a nossa dívida seja considerada “lixo” financeiro e que a probabilidade de falência esteja acima dos 50%.

No entanto, será esta a verdadeira percepção de um investidor racional? Talvez sim, talvez não.
O oligopólio das agências de Rating situa-se do outro lado do Atlântico, onde o interesse em reequilibrar a “balança”, favorecendo o Dólar Americano, começa a tomar proporções criminosas.
Assim sendo, estas agências encontram-se do lado da barricada onde coabitam com investidores que beneficiam das “perturbações”, vulgo, especuladores.
Mas mesmo esta estreita relação já teve maus dias, em especial no caso Lehman Brothers, banco de investimento com notação Aaa (a mais elevada de todas, isto é, obrigações de “elevada qualidade”, sujeitas ao mínimo risco), deixando muitos destes investidores, privados das suas fortunas.

Coloca-se em questão a credibilidade destas agências e as suas intenções perante tão feroz ataque às economias europeias mais fragilizadas com a crise Financeira, que colocou a nu o efeito de se utilizar o dinheiro para fins ineficazes e ineficientes.
Surpreende-me que nenhuma repare na “bomba-relógio” do seu País, Estados Unidos da América: a crise da Dívida, também já chegou e quando se fala numa proporção de 100% do PIB americano, fala-se em triliões de dólares. Curiosamente, continua classificada como Aaa, apesar das ameaças de downgrade… Acrescendo a este problema existe a China, principal credor americano, que detém uma grande parte da dívida, como controlo cambial.

É assim tão pessimista da minha parte considerar que em menos de 5 anos estaremos numa nova crise, cuja dimensão poderá ser inimaginável? Talvez não… Assim, mais vale precaver e cortar no subsídio de Natal e no “biberão” da Segurança Social, pois tempos difíceis estão para vir.
Muito provavelmente cumpriremos o que foi acordado. Resta saber em que situação estrutural ficaremos e se teremos capacidade de enfrentar uma nova crise, que irá limitar o acesso a crédito externo, por parte do Estado e de Bancos.

Será que Portugal continuará no “lixo”, ou trocará de posição com as agências de Rating, cujos interesses são plenamente evidentes, zelando pela especulação e pouco pela verdade financeira (especialmente para o caso Americano)?
Fará assim tanto sentido criar uma agência de Rating europeia, para uma simples “luta de crianças” com as americanas? Muito provavelmente, uma ideia concebida de forma precoce levará ao descrédito total deste tipo de instituições, caindo-se no vulgar exemplo do "puxar a brasa à sua sardinha".

Na minha perspectiva, uma coisa é certa: daqui a 10 anos, todo o Sistema Financeiro estará bem diferente, pois aquele em que actualmente vivemos é absolutamente insustentável para a Economia Mundial.

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